Qual o valor de um amigo?
Para respondermos qual o valor da Cavalgada na Trilha dos Santos Mártires, faz-se mister responder a questão que a abre a escrita.
A IX Cavalgada na Trilha dos Santos Mártires juntou velhos amigos e também trouxe outros novos, que a cada galope se aproximam com objetivos comuns. Vêm de todas as bandas deste Estado e também de fora dele. Outras regiões do Rio Grande do Sul e do Brasil e juntam-se aos missioneiros e a patas de cavalo e mulas percorrem a judiada região interiorana das Reduções da Banda Oriental do Rio Uruguai na divisa com a Argentina. Aos olhos dos que já participaram da trila agonizam as comunidades interioranas, por escolas com turnos fechados e seus alunos levados a escolas polos longe da comunidade; o êxodo dos jovens para as cidades maiores em busca de condições melhores de vida deixando no interior pessoas já de mais idade, que se esforçam, com as condições que lhes restam, para manter suas comunidades em pé, mesmo que não saibam porque, já que seus netos nelas, talvez, serão visitantes esporádicos e não os beneficiários; dos campos nativos que cada vez mais dão espaço as monoculturas e a mecanização, em processo aparentemente irreversível de desertificação verde, afastando do interior de nossos municípios a agricultura familiar de subsistência que é uma forma eficaz de fixar maiores populações no campo.
Irmanaram-se na cavalgada, os cavalarianos, sua comitiva e os habitantes das localidades por onde passamos. Os cavalarianos vieram de todas as querências de nosso Estado e de fora dele, carregando em seus espíritos a vontade fazer amizades, ajudar o próximo, difundir as coisas das tradições gaúchas e trocar experiências com os outros da cavalgada e os que encontraram pelos caminhos missioneiros. Cavalgaram em numero nunca menor que 25 e por vezes superior a 50 pessoas, que iam em sua maioria em cavalos, mas sempre acompanhados de mulas e burros. Os cavalarianos foram escoltados por todo o caminho por um caminhante, e alias, dois, pois do Passo do Padre até Assunção do Ijui eles eram dois a pé e dali pra frente apenas um seguiu até o destino final no Caaró. Este cavalarianos nunca deixaram de ser servidos por prestativa comitiva de apoio, deveras importante para o bom andamento da Cavalgada.
Cavalgaram sob os ideais jesuíticos missioneiros muitas pessoas, que se qualificavam de diversas formas, haviam homens e mulheres das mais variadas idades, desde os infantes até os vetustos, passando por todas as fases da vida. Ao grupo que percorreu de ponta-a-ponta os caminhos da trilha, iam e vinham cavalarianos das localidades adjacentes, e entre estes estavam normalmente grande número de criança tuteladas hora por seus pais hora pelos cavalarianos que as recebiam com jubilo e satisfação. É uníssono entre os cavalarianos que as crianças precisam ser agregadas para garantir desde logo sua ligação com a Trilha dos Santos Mártires, com as suas comunidades e com os valores que são necessários a cidadania e a boa cultura missioneira.
As crianças merecem capitulo apartado, tamanha é a alegria de vê-los entre os cavalarianos. Eles trazem uma esperança boa de que não se cavalga em vão e por tempo limitado, estão neles nossas garatias de que o espirito missioneiro vai se perpetuar no tempo e haverão herdeiros para a terra e as tradições de nossos antepassados. Nos permitem sonhar com uma era de respeito, tradição e desenvolvimento para as Missões. Todos são bem vindos e agregados a tropa que sonha com um mundo melhor, mais equilibrado e justo. Cavalgaram crianças muito jovens e com muito a aprender, tuteladas por todos os cavalarianos entre os quais estavam homens de muita idade e sabedoria, aproximando estas gerações.
As técnicas modernas de terapia põem as pessoas com deficiências em contato com os cavalos. Na conhecida equoterapia, e a cavalgada também teve seus momentos com isso. Do Passo do Padre a cidade de São Nicolau cavalgou conosco um menino com deficiência visual e no Rolador uma menina com Sindrome de Down depois de uma volta a cavalo não queria mais desmontar.
Os municípios representados na Cavalgada foram São Nicolau, São Luiz Gonzaga, Caibaté, Mato Queimado, Cerro Largo, Roque Gonzales, Salvador das Missões, Gravataí, Venâncio Aires, São Borja, Itaqui, Porto Alegre, Santa Rosa, Três de Maio, Santo Cristo, Santa Maria, Sarandi, Pirapó, Dezesseis de Novembro e Ivora. Essa comitiva seguiu os passos dos 3 Santos Mártires do Caaró, jesuítas espanhóis, que entraram em território que hoje pertence ao Estado do Rio Grande do Sul no dia 03 de maio de 1626, percorrendo o caminho que atualmente pertence aos municípios de São Nicolau, 16 de Novembro, Pirapó, Roque Gonzales, São Pedro do Butiá, Rolador, Mato Queimado e Caibaté.
A cavalgada segue não só os caminhos das Reduções, mas também os mesmos anseios de desenvolvimento e ideais de comunidade que tinham os padres jesuítas. Em todas as paradas há trocas de ideias e também palestras. Nas palestras ouvem os habitantes locais e os cavalarianos. As paradas, necessariamente, têm todas o fogo de chão que aquece a cambona com a água do mate, que vai rodar enquanto as pessoas conversam, não com microfones e discursos que obrigam ao monologo, mas sim com franqueza em um espaço verdadeiramente democrático em que tanto cavalarianos quanto as pessoas do local trocam ideias e ideais ao pé-da-orelha, dizendo dos problemas e possíveis soluções para as mazelas que nos cercam a todos, e além disso tem os causos e anedotas que se juntadas todas e de todos dariam material para vários livros. Dizem os sábios que ouvir é mais importante que falar, e então nesta Ágora Missioneira ouvimos para propagar os anseios desta sofrida e desamparada região. Nas paradas juntam-se não apenas os cidadãos comuns, mas também as autoridades regionais e municipais irmanar com todos e participar também das conversas.
E dito tudo isso, voltamos a nossa questão inicial, para sabermos o valor que tem a nossa Trilha. A humanidade se distancia dos animais pela cultura que produz e passa de geração para geração, e o coroamento de um movimento cultural está, por exemplo, em ser reconhecida em lei a Trilha dos Santos Mártires como patrimônio cultural de nosso Estado. A IX Cavalgada na Trilha dos Santos Mártires das Missões, reúne em seu entorno amigos novos e antigos, das mais variadas classes sociais e inúmeras ideologias cada um tão raro e necessário ao todo da trilha que acaba por torna-la algo orgânico e de valor inestimável à região das Missões.
Sem o apoio dos municípios e suas entidades sociais seria impossível a realização da cavalgada, também sem o apoio que acompanha os cavalarianos pela trilha não haveria possibilidade de sucesso na empreitada. Sem as pessoas que nos recebem de braços e coração abertos, e se esforçam para tudo esteja da melhor forma possível não haveria que se dispusesse a seguir o caminho. E não menos importante do que todos os outros elencados fica o reconhecimento aos cavalarianos que atendem o chamado da trilha e deixam o conforto de seus lares e o seio de suas famílias para enfrentar estrada, pó, sol e todos os outros obstáculos que a estrada impõem, para ter como recompensa o sino da Igreja de Todos os Santos Caaró a dobrar em sua chegada. Tudo mais pode ser discutido, mas os feitos de nossa vida nos representarão quando formos desta existência, lembrando-nos como cidadãos e merecedores do reconhecimento da Região Missioneira, e é a estes Cavalarianos que se põem hoje a aplaudir os missioneiros.
As fotos e texto tem os créditos de Venícius de Oliveira.
programação da 9ª cavalgada na trilha dos santos mártires
Cavalgada na Trilha dos Santos Mártires
Trilha dos Santos Mártires Região das Missões
Lei Que Distingue A Trilha Dos Santos Mártires