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23/07/2018 19:16


As Missões, Sua História E Seu Legado. Por João Antunes.

     Esses admiráveis padres espanhóis e portugueses, membros da Companhia de Jesus em missão apostólica, sendo a “alma” de tudo, com fé inabalável, grande abnegação palmilharam enormes distâncias, campinas, descampados e selvas inóspitas enfrentando as intempéries da natureza, doenças, asperezas de toda ordem, sofrendo horrores, padecendo fomes, enfrentando feras, rejeições, sacrifícios, renúncias e largos e afanosos trabalhos, como obreiros de enorme tenacidade e ínclitos soldados da fé, dotados de caridade imensa, amor pelo gentio, poder de comando e gana regaram com o suor e sangue e fundaram os alicerces, dessa obra gigantesca chamada de Missões e na dilatação da fé acenderam a luz de uma esperança, recrutaram milhares de almas para o grêmio da cruz conquistando essas almas perdidas que desconheciam a verdade eterna e assim os Padres ergueram com os índios a admirável Civilização Cristã das Missões ou Reduções, que foram povoações modelares. 
Sabe-se que mesmo ante a “preguiça” presente na maioria dos índios, algo que lhes estava na cultura por serem silvícolas, mesmo assim os Padres conseguiram motivá-los ao trabalho e a fazerem obras magníficas, serem catequizados e viverem num outro tipo de comunidade e outros modos e moldes, costumes e responsabilidades. Imaginemos, por exemplo, as duras penas e o quão trabalhoso foram para se extrair, transportar e moldar as pesadíssimas pedras e erguerem os templos, taipas e prédios com os precários meios que dispunham na época. Somente a força de vontade, um enorme ideal e um esforço hercúleo foram capazes de mover essa gente nesse magnífico projeto: as Missões, que foi fruto de acurados esforços, teve seu apogeu e depois, lamentavelmente, a decadência.
Os índios, por sua natureza e cultura própria, eram excelentes imitadores e conseguiam fazer algo novo com as mesmas ou melhores características que as da própria matriz que se lhes era apresentada transformando-se assim em formidáveis operários, musicistas, artesãos, etc. Então eu fico a pensar que tempo fantástico de mudança e construção houve naquela época. Surgiram novos modelos de casas, novos instrumentos de trabalho, de caça, de música, de estátuas, de plantações, de hábitos alimentares mais saudáveis, de novos modos de higiene, de disciplinas, de organização, etc. 
As constantes ameaças dos bandeirantes, caçadores de silvícolas vindos principalmente de Piratininga, onde estes “arrancavam” os pobres índios indefesos daqui formando as grandes levas de miseráveis cativos que eram apresados e vendidos como escravos. A primeira bandeira que assolou o território rio-grandense-do-sul estava sobre o comando de Raposo Tavares em fins de 1636, entre tantas expedições que se sucederam ao longo de vários anos quando foram cometidas atrocidades nesse “bandeirismo seiscentista” até que os bandeirantes fossem expulsos como aconteceu através do desbarato de Mbororé. E também as rivalidades seculares e o antijesuitismo das cortes de Portugal e Espanha onde, lamentavelmente, e também por questões geográficas, as Missões ficaram arrasadas no meio dessa longa e duradoura peleja por diversos outros interesses.
Os padres introduziram o gado vacum e os animais cavalares que se multiplicaram e se espraiaram rapidamente. Sei, pelas pesquisas feitas, e muito me chama atenção, que a saga dos cavalos aponta que estes vieram de uma época muito remota quando viviam junto ao povo Botai, no atual Cazaquistão, de lá foram disseminados pela região da Arábia e trazidos para a Alemanha, Hungria e toda a Europa. Depois os cavalos aportaram na Argentina, trazidos por D. Pedro de Mendoza e daí para o Paraguai por Alvar Núñes Cabeza de Vaca, que foi o descobridor das Cataratas do Iguaçu. Aqui nas Missões Orientais os cavalos foram introduzidos pelo Padre Cristóvão de Mendoza, que era chamado de Pai Quirito.
Chama-me atenção o registro de que após o martírio do Padre Roque o seu cavalo teria sofrido dando sinais de pesar pela falta do missionário seu amigo e seu dono e, por isso, relinchava tristemente e não consentia que índios o cavalgassem, então os índios abateram este cavalo e isto aconteceu no Caaró no final do mês de novembro, após a data de 15 de novembro de 1627, quando foram martirizados os Padres Roque González e Afonso Rodriguéz. O Padre João Del Castillo foi morto dali dois dias.
Sepé Tiaraju, filho da redução de São Luiz, sobre o lombo de um cavalo no contato com Gomes Freire teria dito ao general esta célebre frase: Co yvy oguereco yara!, ou seja, Esta terra tem dono!
Mais tarde, na viagem dos acontecimentos, D. Miguel Caraí, no lombo dos cavalos, foi considerado o último dos minuanos e o primeiro “gaúcho de campo”. 
O gado também constituiu-se num peso enorme para o bem da nossa economia.
Em 1801 houve a Conquista das Missões sendo incorporadas ao domínio português onde muito disto se deve a José Borges do Canto e seu grupo que mesmo não sendo este o propósito primeiro foi “empurrando” as fronteiras.
Na sucessão do tempo, devido a lutas, contendas e refregas o riquíssimo espólio missioneiro foi sendo saqueado onde as estátuas, a prataria e as alfaias dos templos trocaram de donos, sumiram. Os templos majestosos foram ruindo relegados ao descaso e também os moradores mais próximos foram destruindo para ocuparem os materiais em propriedades particulares, atos errados e impensados.
Mesmo com todos os acontecimentos que determinaram páginas sombrias ainda hoje, podemos tirar belas lições de tudo o quanto as Missões, sua história e seu legado nos representam. Eu entendo que ainda hoje as pedras falam e os sinos ainda tocam ressoando ecos que nos fazem pensar.
Do tipo primitivo, do semi-bárbaro, que foi o gaudério, nasceu o gaúcho do campo com arraigado amor à terra e as raças foram se mesclando entre espanhóis, portugueses, nativos. Depois os negros muito contribuíram neste processo. Vieram os imigrantes que sob diversos aspectos enriqueceram este pago gaúcho assomando trabalho e cultura. Hoje, somos frutos de um pouco disso tudo e eu sinceramente acredito que devemos, no tempo presente, na paz e no amor fraterno, dentro das nossas virtudes, deixarmos sementes fecundas para outras gerações. Assim eu penso! 
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