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09/05/2018 15:14


PROFISSÃO: AGRICULTORA E CAMINHONEIRA

O movimento iniciado pelos caminhoneiros está mobilizando a sociedade brasileira, que está se manifestando de todas as formas possíveis. Como não poderia deixar de ser, também nesta paralisação a presença feminina é intensa e faz a diferença. Já não são mais apenas os homens que atuam neste universo de transporte de cargas. As mulheres vêm se destacando também nesta profissão.
Vamos conhecer um pouco da trajetória de uma dessas lutadoras, Lenir Zago, que tem 51 anos de idade. Ela está na estrada há mais de 20 anos acompanhando o marido, Jair Zago, mas desde 2015, dirige o caminhão revezando o volante com seu esposo. Foi agricultora até os 21 anos de idade e aos 8, já fazia fogo no fogão a lenha, cuidava as panelas, e à tarde ia junto com os pais para lidar na lavoura.
Nessa época, ela morava na Linha 8 Oeste, que pertencia ao município de Ijuí, atualmente interior de Coronel Barros.
Aos 20 anos decidiu vir pra Entre-Ijuís, na região das Missões do Rio Grande do Sul, onde reside até hoje, e retomar seus estudos. Logo começou a trabalhar no Sindicato dos Trabalhadores Rurais e mais tarde no comércio. Mulher forte, que reconhece a luta feminina para conquistar seu espaço e respeito no mercado de trabalho, especialmente a mulher da área rural.
Lenir Zago fala da importância de não desistir e da força que move seus sonhos, mesmo vivendo na boleia de um caminhão. “Dirijo direto com meu marido. Viajamos diariamente e quando um fica cansado, o outro assume a direção. E assim seguimos, até chegarmos ao nosso destino”.
Fiz a entrevista com a Lenir durante a mobilização dos caminhoneiros, no trevo de Entre-Ijuís. Durante todo tempo em que conversamos, mesmo quando minha abordagem era sobre as dificuldades enfrentadas, ela respondia sorrindo, sempre com um brilho especial no olhar. Perguntei a ela o motivo e, eis a resposta: “me sinto feliz. Foi a forma que encontrei de estar perto do meu marido. De tomarmos café, almoçarmos e jantarmos juntos, ainda que seja tudo feito com o que temos na caixa de boia. E, principalmente, de ajudá-lo, pois sei muito bem das dificuldades e riscos que os caminhoneiros enfrentam viajando sozinhos dia e noite”.
Passei a manhã toda apoiando o protesto dos caminhoneiros, que considero muito, muito justo. Até porque, meu pai foi caminhoneiro e tenho uma noção das dificuldades desta categoria que, no meu entendimento, representa sim, o sangue que corre na veia do Brasil. Por isso, quero agradecer a forma gentil com que me receberam, apesar das circunstâncias. Em especial, agradeço a Lenir e seu esposo pela atenção e pelo almoço. O pão com salsicha estava supimpa, mas a companhia de todos vocês, caminhoneiros e agricultores, estava melhor ainda. Eu estava lá não apenas como jornalista, mas como cidadã brasileira, que também sonha e acredita que dias melhores virão.
QUANDO VOCÊ COMEÇOU A TRABALHAR NA AGRICULTURA?
Lenir Zago – Aos 8 anos de idade. De manhã eu fazia fogo no fogão a lenha, cuidava das panelas e de tarde ia junto com meus pais lidar na lavoura onde morávamos, na Linha 8 Oeste, que pertencia ao município de Ijuí, atualmente interior de Coronel Barros. E assim foi até os meus 21 anos, quando vim pra Entre-Ijuís e retomei meus estudos. Em seguida abriu vaga e fui trabalhar no Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Depois assumi na lotérica, onde fiquei até me aposentar. Mas nunca deixei de lidar com a terra.
COMO É O DIA A DIA NO MEIO RURAL? 
Lenir Zago - Olha, é muito sofrido. Eu tenho dó, principalmente das agricultoras. É preciso acordar bem cedinho, tratar os animais, tirar leite e lidar o dia inteiro pegando sol quente. Tem que comprar fertilizante, tem que comprar o óleo, comprar semente e, quando chega a época da colheita, os agricultores colhem o produto, que não está valendo mais quase nada. Isso já vem de muitos, a vida dos agricultores é sofrida e pouco valorizada. Não deveria ser assim, pois se os produtores rurais param, a cidade para também, porque tudo o que a gente precisa vem da agricultura.
E A VIDA NA ESTRADA?
Lenir Zago – Quando conheci meu marido ele já era caminhoneiro e motorista. Sempre que possível, por mais de 20 anos, eu viajava junto porque era o melhor jeito de estar perto dele. De 2015 pra cá, estou efetiva na estrada ao lado dele. Dirijo o mesmo caminhão e viajamos bastante. Quando um fica cansado ou com sono, o outro assume o volante. E assim, vamos revezando até chegarmos ao nosso destino.
QUAL É A CARGA QUE VOCÊS TRANSPORTAM?
Lenir Zago - Levamos soja, trigo e milho da região das Missões para Rio Grande. O retorno de Rio Grande é com o fertilizante, com o adubo.
COM QUE FREQUÊNCIA VOCÊS VIAJAM?
Lenir Zago – Diariamente. Carregamos um frete aqui na região das Missões, normalmente até meio dia. Levamos em torno de dez horas de viagem até Rio Grande. Chegando lá, vamos pro pátio, onde está marcado o carregamento, e aí vamos pra outra firma marcar o adubo. No momento em que o adubo está carregado voltamos, recarregamos novamente e seguimos viagem de novo.
MAS ENTÃO, EM CASA VOCÊS SÃO VISITA?
Lenir Zago – Somos sim. Não paramos em casa. Inclusive, em época que não tem frete na nossa região, partimos de Rio Grande para Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, entre outros estados. Gostamos muito de ir à Mato Grosso do Sul, pois lá compram muito fertilizantes. Então, de um jeito ou de outro, sempre estamos na estrada.
TEM TEMPO PRA DESCANSO?
Lenir Zago – Muito pouco. Primeiro passo, quando chegamos em Rio Grande, é fazer a marcação da placa do caminhão e ficar num pátio. Depois, vem o guarda e avisa que ele está liberado para ir pra filar carregar. O caminhoneiro espera na fila, mas ele não tem como ficar descansando, porque a qualquer momento eles vêm, batem no vidro e dizem: ô motorista, você tem que puxar fila, ficar andando. Isso é bastante cansativo. Muitas vezes passamos a noite se dormir, à espera de que nos chamem.
QUAIS SÃO AS DIFICULDADES E OS RISCOS? 
Lenir Zago – Dificuldades a gente sente, porque tem épocas bem difíceis. Como essa atual temporada que o frete subiu, em época de safra. A gente faz a carga, coloca o peso certo, vai ao posto abastecer e, do valor do frete, já vai pro diesel. Desse diesel, depois tem o pedágio pra pagar que, quase sempre, é custeado pelo caminhoneiro. Às vezes a transportadora até manifesta e coloca lá o valor do pedágio, mas é descontado do valor do frete. Quanto aos riscos, muito raro fazer uma viagem ser ver acidente com caminhão. Acredito que além do cansaço, um dos principais motivos pode ser o uso do celular. Os motoristas precisam ficar muito atentos, sempre.
COMO É A ROTINA DE CAMINHONEIRA?
Lenir Zago - Pra ser caminhoneira, em primeiro lugar precisa gostar. Gostar de estar na estrada, de morar na boleia do caminhão, dentro de uma pequena cabine. O banho é tomado em posto, nem sempre é um banheiro limpo, muitas vezes temos que pagar pelo banho, não tem horário e nem conforto pra dormir. Mas eu gosto e me adaptei muito bem a essa rotina. Quando temos tempo de fazer almoço, tem a caixa de boia. Nela tem fogareiro e a gente faz comida. Este foi um dos fatores que me levou a viajar com meu marido. Eu sempre em casa com meu filho, que está fazendo faculdade em Rio Grande, e meu esposo na estrada. Nunca a gente tinha como fazer as refeições juntos.
SER CAMINHONEIRA É....
Lenir Zago – Uma escolha. Eu escolhi estar sempre junto do meu esposo e me sinto feliz. Gosto muito do meu trabalho, de conhecer pessoas, fazer novas amizades. Encontrei muitas mulheres que também acompanham o marido e dirigem caminhão. Gosto muito do que eu faço. Um dos motivos de eu ter tido só um filho foi por isso. Enquanto ele esteve na escola, não pude viajar. Eu sentia muito falta. Quando ele fez seis anos teve que ir pra escola, e eu não pude acompanhar meu marido. Mas, eu sempre repetia: ainda vai chegar o dia de viajar novamente.
O QUE VOCÊ TEM A DIZER PARA OUTRAS MULHERES DE CAMINHONEIROS? 
Lenir Zago – Que se elas puderem acompanhem seus maridos caminhoneiros, pelo menos em algumas viagens. É uma oportunidade de estar mais perto dele, de tomar um mate, de tomar café, de almoçar, de jantarem juntos. E também de compreender melhor o trabalho de quem passa a maior parte de sua vida na estrada. Às vezes, a mulher não consegue se adaptar. Mas, vale a pena tentar porque se não formos junto, o marido passa a ser somente uma visita em casa.
QUAL A SUA ANÁLISE SOBRE A GREVE DOS CAMINHONEIROS, QUE PAROU O BRASIL?
Lenir Zago – Nesta última semana que fomos a Rio Grande, chegamos num posto por volta da meia noite e pagamos um valor no diesel. No outro dia, voltamos no mesmo posto e o valor do diesel já tinha subido. Fomos percebendo que todo dia estava subindo o diesel, enquanto que os fretes já começaram a baixar porque já passou o período de safra. Não dava mais pra continuar assim. O frete só pro diesel e depois ainda tem os pedágios, além do desgaste do caminhão, dos pneus. Volta e meia quebra alguma coisa por causa de estradas ruins. Com uma carga pesada em cima do caminhão, passando em buracos, claro que vai quebrar. E temos que ir pra oficina, porque não temos como andar sem consertar. Fiquei muito contente em ver que os agricultores, o pessoal das vans, taxistas, transporte escolar também aderiram à nossa luta. As pessoas se uniram, em especial na região das Missões. Precisamos muito do reforço do comércio, que nos ajudem. Se o caminhoneiro não vem trazer os produtos, seja qual for o setor, eles não terão o que vender. Muitos comerciantes já nos apoiam, mas precisamos de todos nesta luta, que é de todos nós, brasileiros. 
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Karin Schmidt
Jornalista e Documentarista
KSS Comunicação

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