Está vendo este pequeno grupo de cruzes sem nomes num cercado pedras, aí enterrados? Neste chão existe um espírito nobre enterrado. Um exemplo materializado, que vai além da taipa, do pampa e chama o nosso bom Deus a olhar com carinho para o Cemitério dos Cativos, onde negros e brancos se tornaram imortais pela compaixão e dignidade de suas vidas. Depois da morte somos todos iguais. E essas pedras manchadas com o suor e sangue dos escravos guardam cruzes que se somem chão adentro, semeando a paz e a igualdade entre os homens.
Certa feita, pelos idos de 1840, havia pelos campos da Bossoroca um poderoso estancieiro chamado Barrios, dono de grandes terras. Tinha consigo um coração endurecido, só fazia o que lhe agradava, o que era sua vontade e trazia a justiça em suas mãos. Com toda a flexibilidade e injustiça de quem se acha dono da verdade. Proprietário de muitos escravos, de poucos amigos, mantinha a distância e o poder como marca em tudo o que fazia.
Certa feita, na construção de uma taipa, uma mangueira de pedra, juntaram-se dois grandes grupos de escravos a carregar pedras. As crianças, que não conhecem cor entre os homens, brincavam, correndo por todo o lado, alegrando e colocando poucos sorrisos nos escravos que trabalhavam carregando pedras de um lado para outro. Entre elas estava um menino branco, enteado de José Fugante, lindeiro do coronel que se envolveu em um acidente entre as pedras vindo a sofrer um sério ferimento. Os escravos rapidamente acudiram-no, mas o menino veio a falecer horas depois.
O Coronel Barrios ficou irado, pois não tinha como pagar indenização a sua vizinha, por um branco, por um filho. Chamou o capataz, mandou degolar os três escravos que tentaram amparar o guri. Decepando a cabeça de um, colocou-a em frente a senzala, para que as crianças nunca mais esquecessem e não brincassem juntas.
Ver aquela injustiça estaqueada na porta abriu todas as mágoas de uma vida de escravidão. Todos sofreram pelo menino acidentado, mas ver os que ajudaram serem mortos com tamanha brutalidade acirrou os ânimos. Asirou-lhes os animos, e os olhos negros cegaram-se de ira.
Dias depois, quando o estancieiro deitou-se junto a uma árvore para sestear, os escravos se combinaram: prenderam o capataz, e depois, com paus e pedras, mataram o fazendeiro Barrios, que não pode nem reagir. Morreu numa avalanche de tudo o que semeou.
O vizinho, que era padrasto do menino falecido, ao retornar de uma carreteada e saber do ocorrido, balançou a cabeça em um suspiro cansado: “Não se conserta um erro com outro”.
Este padrasto, senhor José Fugante, tinha por seus escravos outro tipo de tratamento e sentimento. E fez um pedido a seus familiares: que quando parasse de tropear neste mundo, gostaria que seu corpo fosse colocado junto aos escravos. Assim foi feito, ficando conhecido como o Cemitério dos Cativos.
Casos como esses têm uma particularidade a mais, e muito nobre, pois sepultar um negro no mesmo chão de um branco era crime nessa época.
Em 1850 começou a tornar-se proibido o tráfico de escravos, mas o negro ainda era considerado por lei um “elemento servil”. Somente após 13 de maio de 1888, com a assinatura da Lei Áurea, que estes gaúchos, José Fugante e os negros sacrificados, deixaram de ser contraventores, mesmo depois da morte. São, ainda hoje, exemplos a toda terra, de que somos todos iguais por cima ou por baixo do chão. O pequeno grupo de cruzes, encaixotadas por muralhas, está localizada no distrito de Igrejinha, a cerca de 7 Km da cidade. Consta ser o único do gênero no Rio Grande do Sul.
Fonte Prefeitura de Bossoroca
Por Otavio Reichert
Pajada sobre o Cemitério dos Cativos.
Vídeo sobre o Cemitério dos Cativos.Maiores detalhes da rica história e os patrimonios de Bossoroca, seus filhos, suas riquezas culturais e peculiaridades entre no Blog Bossoroca RS uma das mais completas paginas sobre as riquezas de um município missioneiro.
Cemitério dos Cativos
Bossoroca, RS
Localizado num local chamado Igrejinha, a cerca de 7Km da cidade.
Telefone: (55) 3312-9485