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11/03/2021 10:00


As Bandeiras e a Batalha de M'BORORÉ

Para entender melhor a Batalha M'Bororé ocorrida entre 11 e 18 de março de 1641, no rio Uruguai, é preciso que voltemos no tempo. Aconteceu no local denominado Penhasco M’Bororé, junto ao Porto Vera Cruz, no município de Panambi, na Província de Missiones, na Argentina, onde os nativos guaranis aniquilaram os Bandeirantes que eram “caçadores de índios”. As Bandeiras caracterizavam-se por expedições, incursões, de caráter particular que, formalmente, não tinham o apoio das autoridades portuguesas.  A finalidade das Bandeiras era a exploração de território em busca de ouro, prata, pedras preciosas e apresamentos de índios.
Os Bandeirantes paulistas, organizados em grupos, avançavam e palmilhavam terras desconhecidas por enormes distâncias, enfrentando as intempéries do tempo e as agruras da época onde o Brasil deve a eles, num aspecto, a própria extensão territorial brasileira, pois eles foram “semeadores” de vilarejos que depois se tornaram cidades. Mas, por outro lado, eles foram verdadeiros predadores da vida humana, em especial aos índios. Detectada a aldeia a ser atacada, no acampamento, por parte do bando armado dos Bandeirantes, havia sempre um preparo de afiação de facas, alfanges (sabre curto), machetes (facões), lanças, porretes, outras armas da época, laços e correntes.
Os ataques, verdadeiro espetáculo de horror e que costumeiramente eram feitos de surpresa, onde impetrava-se o terror e a matança, principalmente às crianças, velhos, indefesos e, inclusive, queimava-se gente viva além de alguns aproveitadores nos estupros. Para a carga desses bárbaros sanguinários, procuravam amarrar e acorrentar o maior número possível de índios que eram chamados de “peças” que, aprisionados, formavam hordas (pequenas multidões). Eram levados em triste e penosa marcha de quase 1500 km, por mais de dois meses, a pé e muitas vezes sob os açoites dos chicotes, maus tratos diversos e violência moral. Posteriormente, eram vendidos ou usados como escravos nas lavouras na vila de São Paulo, este um celeiro do Brasil colonial.
Nessa época a própria manutenção da subsistência não era nada fácil. Eles carregavam uma espécie de pasta amarelada de mandioca, que era a farinha de guerra onde, às vezes, mofava e juntava até baratas. Comia-se caça quase de tudo, desde veados, pacas, cotias, tatus até macacos, larvas, cobras, sapos, formigas e lagartos. A dieta era completada, quando possível, com pinhões e outras frutas silvestres. Nessa aventura alguns morriam de inanição (enfraquecimento por falta de alimentos).
Esse verdadeiro holocausto, genocídio, que foram as Bandeiras, movidas belo abuso e a ganância e exploração do ser humano, na verdade, deu fim ao Tratado de Tordesilhas. A povoação deste vasto território missioneiro muito sofreu na mão dos Bandeirantes que trouxeram epidemias, deixaram órfãos, muita dor corporal e espiritual, levando daqui em torno de 50.000 índios. Vale ressaltar que por parte dos Bandeirantes, estes muito dispostos e corajosos, também foram mortos por doenças, fome, terras estéreis e crivados de flechas.
As investidas e as atrocidades para escravizar os índios buscava sanar necessidades econômicas, e deram-se pelo fato de que a mão-de-obra escrava na época procedente de Angola estava praticamente na mão dos holandeses no Brasil. O avanço das Bandeiras na caça ao índio nas povoações missioneiras somente se reduziu, drasticamente, após a Batalha de M’Bororé. Dali em diante esses aventureiros paulistas voltaram a noroeste de São Paulo escravizando as tribos dos Jês.
Na Batalha de M’Bororé a milícia guarani, além dos arcos e flechas e outros armamentos rudimentares, tinham um número razoável de armas de fogo e contaram nesse episódio com sentinelas bem doutrinados e avançados. Não se sabe o número exato, mas calcula-se que morreram mais de 1500 homens. Estima-se que os guaranis enfrentaram e venceram uma frota de 130 canoas, 1200 índios e 350 Bandeirantes, onde os índios dispunham de 70 canoas armadas com 57 arcabuzes (primitiva arma de fogo portátil) e arcos comandados pelo capitão Ignácio Abiarú. A luta durou em torno de 7 dias, sendo que muitos daqueles que representavam o lado dos Bandeirantes, os que não morreram na água tingida de sangue, acabaram morrendo nas margens do rio e mata ciliar, selva adentro, alguns devorados por feras e na Redução de Acaraguá. Da parte dos índios, mesmo sendo vitoriosos, houve considerável número de baixas humanas nessa sangrenta batalha.
O local da batalha, através da sua disposição geográfica e as muralhas do mato, foi um lugar estratégico que favoreceu mais os guaranis obrigando os Bandeirantes a uma peleja frontal. As baixas na Batalha de M’Bororé, pela parte dos Bandeirantes, serviram definitivamente para frear a expansão escravagista, com poucas incursões nos anos seguintes, mais raras e menos agressivas.
Por sua vez, os jesuítas mantiveram, junto aos guaranis, uma força armada com autorização da coroa espanhola, haja vista a necessidade de manter viva a necessidade estratégica das Reduções Missioneiras. Esta batalha foi um marco, onde concluiu-se um ciclo e iniciou-se outro de consolidação das Missões onde lamentavelmente, mais tarde, foram vítimas de outros tratados, onde jesuítas e uma enorme massa humana do povo guarani foram aniquilados, dizimados, a citar a Batalha de Caiboaté, pela fusão português-espanhola.
Sobre as investidas Bandeirantes às Missões, a escravidão dos nossos nativos, dos horrores infringidos a eles, onde milhares de vidas inocentes foram ceifadas, cabe-nos uma reflexão sobre estes acontecimentos. Que busquemos sempre ser irmãos de pátria e querência, deixar que a vida siga com liberdade plena e do bom senso. Estarmos sempre alertas, de modo a nunca permitirmos a intromissão alheia, o desrespeito ou ganâncias, trazendo violência e morte, e que nunca mais se repita em terras brasileiras acontecimentos semelhantes a este entre as Bandeiras e suas consequências. Cabe ao ser humano viver para crescer, sendo agente do amor, da paz e da fraternidade. 

Localização da Batalha M'Bororé 
Site: Escritor João Antunes
 é poeta e compositor, de Bossoroca. 
João Antunes (55) 9999-42970 joaoantunes@barracamissoes.com.br 

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